FONTE: JOTA
Programas de governo que fornecem garantias e apoio na gestão financeira são considerados essenciais para reduzir lacuna do mercado
Historicamente tímido, o mercado de crédito para o pequeno empresário no Brasil tem recebido alguns estímulos desde o início da pandemia. Apesar dos avanços, ainda há uma lacuna de cerca de R$ 166 bilhões, segundo estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV) feito em 2021.
A escassez de linhas de crédito para esse público é atribuída, segundo especialistas ouvidos pela reportagem, à falta de garantias do empresário de pequeno porte, da assimetria das informações e do risco elevado.
As novas rodadas e o caráter permanente de programas de governo como o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) e o Programa Emergencial de Acesso ao Crédito (FGI Peac) — além do programa do Sebrae, o Fundo de Aval para as Micro e Pequenas Empresas (Fampe) — disponibilizaram recentemente cerca de R$ 113 bilhões para empréstimos em condições mais justas para os micro e pequenos empreendedores e para os MEI (microempreendedor individual).
Para especialistas, a renovação dos programas é considerada fundamental para evitar o colapso do mercado de crédito à micro e pequena empresa, que, graças aos estímulos, tem liderado a geração de novos empregos no pós-pandemia, respondendo por mais de 70% dos postos de trabalho abertos neste ano.
“A reativação desses programas é extremamente importante. Se não fossem eles no mercado dos pequenos negócios, o cenário de pressão de juros, elevação de custos e endividamento poderia causar um colapso no setor”, explica Caetano Minchillo, gerente da Unidade de Capitalização e Serviços Financeiros do Sebrae Nacional.
Os programas operam com taxas de juros menores do que a média de mercado porque contam com proteção do Fundo Garantidor de Operações (FGO), com gestão do Banco do Brasil para o Pronampe, e do Fundo Garantidor de Investimentos (FGI), operado pelo BNDES para o Peac. Além disso, há o Fampe, que é operado pelo Sebrae.
“O advento desses programas neste ano, com BNDES, BB e Sebrae atuando na área de garantias, tende a reduzir o risco para que instituições se sintam mais confortáveis a emprestar para os pequenos, que historicamente têm mais risco”, completa Minchillo.
Outro ponto positivo foi uma alteração no desenho dos programas que dá um caráter permanente ao evitar que o dinheiro dos fundos retorne ao Tesouro.
“Os programas Pronampe e Peac foram reativados e previstos para operar até 2024, e o Pronampe, em especial, desde 2021 tornou-se um programa permanente, exigindo dotação orçamentária. Para esse ano, os recursos para a honras de garantias que não foram utilizadas, ao invés de retornarem ao Tesouro Nacional, puderam permanecer no FGO e assim permitir novas operações de crédito”, diz Giovanni Beviláqua, economista do Sebrae Nacional.
Um desafio, no entanto, é que o cenário de incertezas e a atual regra do teto de gastos podem reduzir os recursos para este tipo de crédito, como explica o professor Lauro Gonzales, coordenador do Centro de Estudos em Microfinanças e Inclusão Financeira da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (EAESP-FGV) e autor do estudo sobre a lacuna neste mercado creditício.
“Muito provavelmente o teto de gastos será modificado. Está claro na proposta dos candidatos que haverá uma nova regra fiscal e com isso menos recursos para esses programas. O que torna mais importante o papel dos bancos públicos como indutores da concorrência maior nesse mercado e o reforço da atuação das cooperativas. Elas têm atuação local e estão onde os bancos estão menos presentes. Será um desafio encontrar recursos para esses programas a partir do ano que vem”, diz Gonzales.
Para Luiz Esteves, economista-chefe do Banco do Nordeste, o volume de crédito para micro e pequenas empresas é parte do problema, mas os pontos mais sensíveis são melhorar os sistemas de identificação de risco e as garantias bancárias para esse público.
“É necessária uma atuação em vários aspectos. Precisa ter crédito, e recurso é parte mas não o maior dos problemas. É preciso fazer uma identificação de risco melhor, é fundamental ensinar às empresas que é importante que elas tenham geração de informação para as linhas de crédito, para não pegar o dinheiro mais caro. E outro ponto são as garantias bancárias”, avalia.
Outra questão sensível apontada pelos especialistas é a orientação ao tomador do crédito. Apesar da injeção de recursos que os programas atuais trouxeram, os juros altos e a inflação elevam o risco de endividamento.
“É importante que o micro e pequeno empresário troque uma dívida mais cara por uma mais barata, o crédito precisa ser assistido, orientado e planejado, algo no qual o Sebrae vem atuando fortemente por meio de seu programa Crédito Assistido, que auxilia e orienta os empreendedores em toda a sua jornada de planejamento e busca por crédito. Parece uma obviedade, mas todo crédito é uma dívida, e é importante que esses recursos sejam utilizados para que os negócios prosperem”, diz Giovanni Beviláqua.
Como melhorar o crédito para pequenos negócios
* Manutenção de programas como Pronampe, FGI, Peac e Fampe, que contam com proteção de fundos garantidores, com taxas menores e prazos maiores do que os praticados no mercado privado, além do prazo de carência de 11 meses para início dos pagamentos.
* Caráter permanente desses programas citados acima, com recursos que não retornam ao Tesouro, mas são mantidos nos fundos.
* Dotação orçamentária anual para a renovação desses programas.
* Reedição do programa PEAC Maquininhas, que permite que tomadores usem o histórico comercial como garantia, ou programa semelhante.
* Aumento da participação de bancos públicos e bancos de desenvolvimento regionais nesse mercado de crédito, incluindo o BNDES que historicamente financia grandes empresas e agora está com estratégia de apoio aos pequenos negócios.
* Aumento da participação do BNDES no contexto de open banking, com o financiamento distribuído pelas APIs com outros atores.
* Crédito assistido, orientado e planejado, com orientação e capacitação dos empresários, para que os recursos sejam utilizados com o objetivo de que os negócios prosperem.
* Mais divulgação para o fato de MEIs estarem em programas de crédito, como o Pronampe.
* Reforço de crédito para pequenos negócios via cooperativas.
REDAÇÃO JOTA – Brasília
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