FONTE: JORNAL CONTÁBIL

Passados mais de dez dias da publicação do Decreto 12.466, de 22 de maio deste ano, que altera as regras de incidência de IOF sobre operações de crédito, compartilho minha visão sobre os impactos que essa medida traz para o mercado de crédito e para a economia como um todo. Falo tanto pela minha atuação há mais de 20 anos no mercado financeiro quanto por ser diretamente afetado pela medida, uma vez que ela passa a classificar as operações de risco sacado como operações de crédito, algo que, até então, era enquadrado como uma cessão de crédito mercantil.
 

Sendo um profissional que atua diretamente neste segmento faço algumas reflexões sobre como pode afetar o nosso dia a dia. Do ponto de vista técnico este aumento gera um efeito nocivo para a economia real. E é fundamental colocar o foco de luz sob o ponto de vista técnico para que este debate se fortaleça e contribua para uma análise mais aprofundada e madura sobre a medida. IOF como ferramenta arrecadatória ou regulatória?
 

Este foi um dos primeiros pontos levantados por economistas como Marcos Lisboa e Gustavo Franco, que criticaram duramente o caráter regulatório, e não arrecadatório, do IOF. Na prática, o decreto cria uma espécie de CPMF seletiva. Com a medida repentina, bancos, empresas e plataformas foram pegos de surpresa, gerando insegurança jurídica e operacional. Agora, que já estamos nos primeiros dias úteis de vigência da nova regra, vemos instituições adotando critérios diferentes para o cálculo do imposto: alguns sobre o valor bruto, outros sobre o líquido, uns embutindo na depreciação da operação e outros debitando diretamente da conta do sacado. Essas diferenças ressaltam que todos os envolvidos necessitam de mais tempo para adaptação.
 

Afinal, é operação de crédito?
 

A operação de risco sacado tem como lastro uma transação mercantil. O fornecedor (cedente) emite uma duplicata contra o sacado (comprador) e a cede a um terceiro (banco, FIDC, plataforma), recebendo à vista, com deságio. O sacado, por sua vez, não contrata crédito e não recebe recursos, apenas aceita que, no vencimento, pagará ao novo credor (cessionário) em vez do fornecedor original.
 

Trata-se de uma cessão de crédito sem coobrigação, regulada por leis específicas, como:

  • Lei das Duplicatas (5.474/1968);
  • Lei da Duplicata Escritural (13.775/2018);
  • Normativos recentes, como Resolução BCB 339/2023 e Resolução CMN 5.094/2023, que tratam da escrituração e da formalização dessas operações.

Portanto, não há contratação de crédito no sentido clássico, que justificaria a incidência de IOF. A operação é, essencialmente, uma aquisição de um direito creditório. Além disso, o custo já é absorvido pelo fornecedor, que antecipa seus recebíveis mediante o deságio. Sendo assim, não há a necessidade de transferir esse custo ao sacado.
 

Consequências imediatas
 

O efeito prático pode trazer pontos negativos que precisam ser avaliados como: encarecimento do crédito, insegurança jurídica e impacto direto nas cadeias produtivas. Além disso, pode ir de encontro com medidas recentes que têm o objetivo de modernizar o mercado de recebíveis, como é o caso da duplicata escritural que foi lançada para trazer mais segurança, transparência e acesso a crédito para empresas, especialmente PMEs. Impacto nos FIDCs
 

Por outro lado, como em todo movimento de restrição, surgem oportunidades. Os FIDCs (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios) podem ganhar ainda mais relevância nesse cenário. Esses veículos, que já vinham crescendo fortemente, tendem a ser uma alternativa importante tanto para quem busca financiamento quanto para investidores.
 

No entanto, isso não resolve o problema estrutural que a medida pode trazer ao ambiente de negócios no Brasil. E agora?
 

Felizmente, há movimentos importantes no Congresso para analisar de forma mais crítica esse decreto. Nesta semana, inclusive, o governo está trabalhando em uma alternativa estrutural para revisão do IOF, que deve ser apresentada nos próximos dias.
 

Seguimos na expectativa de que o equilíbrio das contas públicas se faça por meio de reformas estruturais e responsabilidade fiscal, sem a necessidade do aumento de carga tributária sobre quem produz, empreende e gera empregos no Brasil.
 

*Thiago Pinotti

Categorias: SINFACOPE

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